A foto acima ilustra a assustadora notícia publicada ontem no site G1, da Globo: "Uma cruz, que faz parte do patrimônio histórico de Ouro Preto, na região Central de Minas Gerais, foi quebrada por foliões nos dias de carnaval. O fato aconteceu no domingo (19) durante a passagem de um bloco. Segundo a Polícia Militar, três turistas foram presas em flagrante e autuadas por dano ao patrimônio público.
De acordo com a assessoria da prefeitura, a cruz fica na Ponte da Barra e é datada do século XIX. A prefeitura informou que vai analisar a situação para tomar uma atitude.
Os pedaços que foram quebrados não foram localizados. Segundo a PM, as três mulheres detidas pagaram fiança e foram liberadas".
Essa notícia poderia muito bem ter como foco o patrimônio ferroviário de Poços de Caldas. Bastaria trocar a "cruz de Ouro Preto" por "Estação Mogyana", por exemplo. Aí leríamos algo assim:
"A Estação Mogyana, que faz parte do patrimônio histórico de Poços de Caldas, na região sul de Minas Gerais, foi danificada por foliões nos dias de carnaval. O fato aconteceu no domingo (19) durante a passagem de um bloco. Segundo a Polícia Militar, três turistas foram presas em flagrante e autuadas por dano ao patrimônio público.
De acordo com a assessoria da prefeitura, a Estação fica no centro de Poços de Caldas e é datada do século XIX. A prefeitura informou que vai analisar a situação para tomar uma atitude.
Os pedaços que foram quebrados não foram localizados. Segundo a PM, as três mulheres detidas pagaram fiança e foram liberadas".
Fácil assim. Não aconteceu, mas poderia ter acontecido, sob o beneplácito do Condephact, conselho que deveria defender o patrimônio histórico, bem como a secretaria de turismo, "locatária" da Estação, que também concorda com a tese do Conselho: "O bem tombado é para ser usado, porque é o uso do bem que faz com que ele se mantenha. Um bem tombado sem uso, ele logo deteriora. Tanto nós, do Conselho do Patrimônio Municipal, quanto o Iepha, que é o Patrimônio do Estado, e o Iphan, pregam isso". Claro que em Ouro Preto alguém "garantiu" que poderia haver o evento que resultou no dano ao patrimônio. Claro, também, que se alguém soubesse o que iria acontecer, teria impedido. Faltou prudência, lá e cá: na porta da Estação de Poços de Caldas há uma placa que diz: "Imóvel tombado através da Lei Municipal no. 5376/93. Proteção conferida aos bens de valor excepcional que devam ser preservados por suas características originais".
É bom deixar uma coisa clara, antes que algum pacóvio se levante contra mim: não estou afirmando que os foliões de Poços de Caldas são vândalos, ou a gente humilde que batalha para desfilar no carnaval depreda patrimônio. Mas há coisas que podem ser evitadas ou contornadas, e sugestões foram feitas. Também não estou ignorando a importância religiosa do monumento de Ouro Preto. Mas a empáfia de muitos seres humanos que recebem o título de "político" ou "ocupante de cargo de confiança" é barreira mais sólida que os muros construídos sobre o leito da ferrovia ao lado da Estação.
Agora, a pergunta: do ponto de vista do patrimônio histórico pura e simples, que diferença há no cuidado que se deve ter com a cruz histórica ou com a Estação Mogyana? Já temos nossa "cruz quebrada", conforme atestam as imagens abaixo: não aconteceu; vem acontecendo.
Para fechar, a frase do amigo Glaucio Henrique Chaves, outro incansável batalhador pela preservação do patrimônio ferroviário: "Para cada notícia dessas, há uma infinidade de danos menores e digo até invisíveis hoje em dia, mas que trarão consequências graves no futuro". Pois é.
Clique nas imagens do Memória de Poços de Caldas para ampliá-las.
"Povo que não conhece sua história está condenado a repeti-la".
O comentário abaixo foi enviado pelo amigo Denis W. Esteves, também batalhador incansável e profundo conhecedor dos temas ferroviários, especialmente da Mogyana, parceiro desde sempre nessa empreitada, merece destaque:
"É triste mas é verdade. O sentido de se preservar o Patrimônio Histórico e Cultural não é mero preciosismo ou simples modismo, é valorizar os bens herdados das gerações passadas como exemplo da capacidade humana de criar e interagir com o meio ambiente e como um documento vivo da sociedade, sua transformação e formação cultural, e garantir que essa herança seja legada às futuras gerações. É preciso que se entenda de uma vez que o Patrimônio Histórico e Cultural não nos pertence, ele pertence à Humanidade e às futuras gerações. Sendo assim, não temos o direito de destruí-lo, de privar as futuras gerações de usufruírem dele em seu estado pleno e íntegro como legítimas herdeiras que são. Não nos cabe consentir, direta ou indiretamente, com a destruição do Patrimônio Histórico e Cultural em nome das futuras gerações.
Os danos causados paulatinamente à estação da Mogyana pela própria Administração Municipal, seja pela não realização de procedimentos de conservação e restauro necessários, seja pelo uso inadequado, são abomináveis, pois em tese são feitos em nome da comunidade, uma vez que que esses gestores foram eleitos ou nomeados por representantes eleitos.
Um Conselho que deveria zelar pela preservação do Patrimônio Histórico e Cultural, mas que é, omisso, subserviente à Administração Municipal e conivente com atos que visivelmente degradam os bens já protegidos por lei ou no mínimo os expõem ao risco de dano, é uma aberração e motivo de grande vergonha.
Infelizmente o amigo Gláucio está certo em sua frase. Toda essa utilização inadequada da Estação, embora não se reflita em danos visíveis no momento, implicará em danos futuros de grande envergadura que poderão por a perder essa valiosa relíquia. Também não é possível continuar arriscando e jogando com a sorte da Estação na expectativa de que nada de mais sério irá acontecer durante alguma das utilizações inadequadas".
1 comentários:
será que as pessoas pensam que "tombado" é para derrubar?
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