São Lourenço fica a uns 250 km de distância de Poços de Caldas. Com pouco mais de 40 mil habitantes, a pequena cidade esbanja algumas riquezas que a colocam em destaque no cenário turístico nacional. Se em Poços de Caldas a menina dos olhos atualmente é a geração de energia elétrica, em São Lourenço a vida gira em torno da famosa água mineral, que hoje corre o mundo pelas mãos da multinacional Nestlé.
O local tem um outro atrativo muito interessante, e o Memória de Poços de Caldas esteve lá para conferir: é o chamado Trem das Águas. Uma antiga locomotiva a vapor, semelhante às que circularam em Poços de Caldas, encarrega-se de levar seis vagões completamente lotados (todos os passageiros sentados, claro) num pequeno trecho de 10 km até Soledade de Minas. O trajeto resume bem as belezas naturais de Minas Gerais e a pobreza que ainda permeia o estado, notadamente moradias humildes e habitantes idem.
Morador de Soledade de Minas fez questão de posar diante da "Maria-Fumaça"
A composição, em condições impecáveis, é atração por si só, seja para as centenas de pessoas que se comovem com a passagem do impressionante equipamento -e são milhares de fotos levando imagens da "Maria-Fumaça de São Lourenço" para todos os cantos do planeta- ou pelo emocionante som do apito e o sacolejar clássico dentro dos carros, tudo isso regido pelo inconfundível som do mecanismo a vapor trabalhando.
É possivel um trem clássico conviver com o trafego contemporâneo
E a pergunta ressurge na mente? Por que não em Poços de Caldas? A receita é simples e demanda boa vontade do Poder Executivo -notadamente do Prefeito e da Secretária de Turismo- para não apenas darem início rápido aos estudos de viabilidade de um projeto de Trem Turístico entre a Cidade e Águas da Prata, mas -principalmente- parar a destruição do patrimônio ferroviário remanescente, começando pelo cercamento absurdo da Estação, que teve seu leito interrompido pela construção de pelo menos meia-dúzia de muros por particulares vizinhos à denominada "Fepasa".
A Estação de São Lourenço funciona como estação. Artesanato local é atração na plataforma
Parece estranho, mas quem deveria estar trabalhando para concretizar a possível volta de uma locomotiva a vapor em Poços de Caldas é justamente a ocupante da estação, a Secretaria Municipal de Turismo que, de suas janelas, assiste a construção dos muros e não se mexe. Ou pelo menos não se manifesta publicamente sobre o grave problema.
Nas pesquisas sobre o assunto, não foi muito difícil descobrir que boa parte do patrimônio ferroviário de Poços de Caldas integra o rol de inventariança da extinta RFFSA (Rede Ferroviária Federal), incluindo a própria Estação, tombada pelo município, bem com as casas da rua Beira-Linha e, para surpresa geral, até mesmo um imóvel central, localizado à Rua Francisco Salles, 343, integra o patrimônio da SPU -Secretaria de Patrimônio da União. Se você Leitor é curioso como eu, telefone para o número (35) 3697-2000 e descubra quem é que ocupa este endereço. É possível acessar o inventário da RFFSA, para ver a relação completa de imóveis da RFFSA em Poços de Caldas -o imóvel da Francisco Salles aparece sob número 120 na referida relação.
Se a questão patrimonial é da esfera federal, parece razoável compreender que a municipalidade não se empenhe como se imagina, ao mesmo tempo que se espera o maior rigor e zêlo se ocupa um espaço histórico e da importância da Estação ou do palacete da Prefeitura (pronto, agora você sabe quem é que está lá na Francisco Salles...). Diferente disso, a Estação foi muito mal reformada e a Prefeitura parece não ter em seus quadros um só pintor de paredes capaz de manter a sede do Executivo em condições dignas. Ameaçando convocar o caminhão de mudança e levar móveis e utensílios para a Rodoviária, a Prefeitura já prometeu até doar o Palacete para uma ainda claudicante Fundação de Cultura, o que parece, diante do exposto até então, inapropriado.
Esse é um ponto. O outro é: será que entre os cinco mil servidores da Prefeitura há um capaz de criar e principalmente levar adiante um projeto dessa magnitude para o turismo local? E ainda, havendo, terá ele amparo oficial para derrubar interesses e muros em prol do projeto? Quem sabe? O assunto já passou, ano passado, pelas mãos do ex-presidente da Câmara Municipal, vindo que São João da Boa Vista, por meio de um projeto de reativação do trecho ferroviário de Campinas a Poços de Caldas. Sabe qual é a única cidade que está incapacitada a receber o trem? Pois é. E o vereador, à ocasião, deu-se ao luxo de provocar quem teria removido os cerca de 10 km de trilhos -sem dizer quem foi, e pior, sem dar andamento ao projeto, pelo menos até onde se tem conhecimento.
A Serra parece a nossa. Festival de balonismo marcou o final de semana
A receita está aí, e basta um sábado em São Lourenço para ver que uma "Maria Fumaça" tem seu valor, é uma fonte interessante de receitas (passagens entre R$ 30 e R$ 40) e certamente as fagulhas que escapam da chaminé da locomotiva têm maior impacto ao olhar dos turistas do que uma série de leds natalinos alugados. Nunca é tarde para chamar a atenção ao fato de que resta da ferrovia só sobrevive em Poços de Caldas por conta da extração de bauxita. Findo o interesse comercial no minério (bem próximo), caso a Prefeitura não assuma a ideia, sepultaremos de vez a história que começou em 1886, com a presença de Dom Pedro II inaugurando o Ramal de Caldas, que tantas riquezas, cultura e desenvolvimento trouxeram a Poços de Caldas.
Estação lotada, mais de 500 passageiros por viagem, fotos percorrendo o mundo
Por fim, na entrada da estação ferroviária de São Lourenço, uma placa com uma frase que não deixa dúvidas: "A cidade que preserva o seu passado, vive bem o seu presente e sabe construir o futuro".
Uma visão que sempre impressiona
Clique nas imagens do Memória de Poços de Caldas para ampliá-las.
5 comentários:
PARABENS PELA POSTAGEM!
Excelente!!!
Quanto se perde na nossa cidade por caprichos e desejos pessoais.
Se nossos vereadores fizessem excursões no trem de São Lourenço ao invés de promoverem tantas excursões à área em que insistem em colocar o Paço Municipal, nossa cidade teria chances de ganhar bem mais.
Concordo plenamente. O trem seria uma fantástica atração turística e um passeio pela nossa região, tão bela, seria inesquecível para muitos. De fato, não dá para entender o descaso dos governantes para com esse nosso patrimônio.
Congratulo-o pelo achado da informação do imóvel da Av. Francisco Salles 343.
Como bem diz o link: http://www.rffsa.gov.br/principal/inventarianca.htm:
"A extinta RFFSA gerava uma despesa de custeio de R$ 187 milhões/ano, que será reduzida gradativamente, na medida em que diversos órgãos da Administração Direta venham a assumir as atividades que estavam na alçada da empresa extinta."
Há de se imaginar então, que, no contexto de incorporação patrimonial, que o prédio da Av. Francisco Salles, 343, deve, em breve, ser incorporado ao patrimônio da Administração Pública Direta, no caso, o Município.
Porém, se houve morosidade por parte da Administração Pública Municipal, creio que o mesmo pode ser dito da esfera federal, que, por receio de impacto fiscal a longo prazo resolveu assumir o inventário público da finada RFFSA por intermédio de MP, e subsequente Lei em 2007. Se as rodovias andam mal com essa crise do DNIT, o que falar das ferrovias?
Esperamos que seja dada um destino final a esse dilema nostálgico. A questão cultural pode ser crucial numa cidade turística, ainda mais numa cidade rica igual Poços, que praticamente não sofre com o que a maioria da população brasileira sofre.
Agradeço aos construtores da cidade, pois até hoje ressoa nos corredores a sua importância.
Postar um comentário
Memória de Poços de Caldas é um trabalho cultural, sem fins lucrativos, e democrático. Aqueles que quiserem se comunicar diretamente com o autor podem fazê-lo pelo email rubens.caruso@uol.com.br .