domingo, 13 de março de 2011

O PALACETE DA FRANCISCO SALLES - QUASE 100 ANOS DEPOIS

 
O ano de 2011 marca o centenário de inauguração de uma das mais belas construções de Poços de Caldas. Localizado na Avenida Francisco Salles, integraria o conjunto implantado duas décadas depois no hoje parque José Affonso Junqueira e Praça Pedro Sanches. "Integraria" pois o palacete acabou isolado, "do outro lado do rio", escondido atrás de uma inconcebível rede de fios elétricos e uma sorumbática estrutura do que um dia deveria ter sido um monotrilho.
  
Não é exagero dizer que um século depois, o velho casarão agoniza, fruto do desleixo dos ocupantes que se sucederam no outrora grandioso trono máximo municipal. A realidade hoje mostra um prédio beirando a tristeza, apinhado de servidores mal instalados, pintura externa descascando, varanda transformada em "fumódromo", puxadinhos construídos à revelia das boas práticas de manutenção de um patrimônio histórico do quilate desse, o que não é novidade em Poços de Caldas -vide Estação Mogyana, onde ousaram recentemente estacionar viaturas da secretaria de turismo sobre o piso hidráulico da plataforma, sem falar do posto de gasolina que fechou o leito da ferrovia para colocar ali um lava-carros, sob as vistas grossas de autoridades que sabem ser o patrimônio da estação e adjacências tombado; as quase ruínas do antigo restaurante do Véu das Noivas ou a "favelinha" na qual residem os patos que ainda fazem a alegria de alguns turistas no laguinho do Country Club.
 
As meninas dos olhos dos "patrimonialistas de plantão" recaem neste momento sobre o Palace Casino em obras e um não resolvido nem bem explicado projeto de "modernização" da Thermas. Não por coincidência, justamente para onde estão apontadas as milionárias verbas estaduais para recuperação dos espaços.
   
Mas nem sempre foi assim, como conta a história, mais precisamente a publicação "Illustração Paulista - Semanario Popular de Actualidades", de 4 de novembro de 1911, do qual há uma reprodução no acervo do Memória de Poços de Caldas. Naquela edição, uma foto do Palacete da Prefeitura trazia como legenda "Magnifico edificio da Prefeitura Municipal, inaugurado no corrente anno e mandado construir pelo actual prefeito, coronel Francisco Escobar".
   
Diz a reportagem que "o novo predio da Prefeitura demonstra o criterio adoptado pela governança local, na transformação planeada em relação as construcções. É um bello palacete occupando aproximadamente 36 x 80 m, constituido por um corpo central e duas alas, ligadas a esse corpo, de frontespicio de cantos dobrados".
   
Ainda de acordo com o semanário, a Jose Piffer, "este operoso e intelligente architecto se devem numerosas construcções em Poços de Caldas, que muito têm concorrido para o aformosamento dessa futurosa villa. De sua lavra é o projecto para construcção do edificio da Prefeitura, de estylo sobrio e muito elegante, tendo cabido egualmente a direcção das obras".
   
Presentes à inauguração da Prefeitura, além do prefeito Franciso Escobar, "Eduardo Ribeiro; dr. João Lisboa e Nelson de Senna, deputados do Congresso Mineiro, dr. José Gonçalves de Souza, secretário de Agricultura; coronel José Augusto da Costa Junqueira, chefe político; coronel Júlio Bueno Brandão, presidente do Estado de Minas; tenente coronel Christo, seu ajudante de ordens; dr. Pedro Sanches, major Libânio Vaz, José Piffer, Estevam Brandão, Lindolpho de Azevedo, do Paiz, Mendes de Oliveira e Pereira de Carvalho, do Diario de Minas".
   
Era o tempo em que Poços de Caldas tinha uma população "orçada em 6.000 almas -mais ou menos", diz o material. Tempos bons, de grandes realizações e políticos que enxergavam longe. Um século depois, a história confirma a necessária capacidade de planejamento de longo prazo que deve ter quem se oferece ao comando de uma cidade -coisa que não se vê por essas plagas há anos, diferente do prefeito Francisco Escobar que, "a 30 de junho de 1910, fez a abertura das propostas para a construcção do predio da Prefeitura Municipal, sendo aprovada a de Otto Piffer por 48:500$000, tendo sido lavrada escriptura de 57:000$000", conforme atesta o livro Poços de Caldas, Synthese Historica e Crenologica, do Dr. Mario Mourão, editado em 1933.
  
Em 2011, planeja-se dar novo destino ao velho Palacete. Pode tornar-se espaço cultural -como aliás parece regra quando se fala de aproveitamento de prédios públicos históricos no Brasil- com a mudança da sede do Executivo para a estação Rodoviária. Uma ideia interessante e que nasce sob a marca da incoerência, pelo fato de termos -o Povo de Poços de Caldas, por meio de seus visionários representantes- comprado vasta gleba para o que um dia seria um Paço Municipal. Esse, pelo jeito, vai entrar para a história.
 
Para encerrar, uma mostra de como a prefeitura vem zelando por seu próprio passado. Em 11 de março o site oficial da prefeitura publicou nota sobre o centenário do prédio, que pode ser conferido aqui. O texto começa com a seguinte frase: "O prédio da prefeitura, na avenida Francisco Salles, completa 100 anos este mês. A data inaugural não está precisa nos registros dos diversos historiadores". A mídia local publicou a nota sem checar a informação, mas há um registro preciso sim, e esta data consta justamente no mesmo "Illustração Paulista", que destaca: "Ainda este anno foram augmentadas as dependencias do mercado publico e atacadas com grande celeridade as obras do vistoso edificio destinado a Prefeitura e Forum, inaugurado em 7 de maio de 1911". O material está à disposição de historiadores e autoridades.
 
Clique nas imagens do Memória de Poços de Caldas para ampliá-las.
  

1 comentários:

Leonardo Ítalo Lindolfo disse...

Muito bom artigo. Trabalho no setor de patrimônio da Prefeitura e realmente não tinha a vaga noção da data certa da inaugação deste palacete.

A lavratura da escritura deste edifício ainda nos é desconhecida, pois como trata-se de um pre'dio centenário muitos documentos, se não preservados, tendem a sumir.

Obrigado pelas informações.

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