por Nilza Botelho Megale
"As ruas ornamentadas com motivos carnavalescos fervem de curiosos e foliões, que se acotovelam para apreciar o movimento e aproveitar, da melhor maneira possível os divertimentos do efêmero reinado de Momo. Ondas sonoras, impregnadas de ritmos quentes e excitantes, penetram pelos ouvidos e se esparramam por todos os sentidos de jovens e velhos, homens, mulheres e crianças.
Artísticos e originais carros alegóricos, rodeados de moças e rapazes usando as mais ricas e variadas fantasias, percorrem a avenida sob o aplauso da população entusiasmada e ao passarem diante do palanque onde ficam as autoridades e os jurados, capricham nas músicas e nas apresentações coreográficas.
Este era o carnaval que conhecemos na década de 1980 em Poços de Caldas, porém nem sempre foi assim. No final do século passado havia o entrudo e o máximo da brincadeira consistia em atirar água com jarras e baldes nas pessoas descuidadas que passavam pelas ruas. Depois veio a farinha de trigo, muito brutal e desagradável. Em 1893 foi fundado o Clube Carnavalesco "Valete de Ouro", com os figurantes vestidos de calção curto e uma capa de cetim, imitando a indumentária dos Congos e usando máscaras.
No início do século apareceram os limões e laranjinhas de cheiro, feitos de leve camada de cera, recheados de água perfumada e colorida, que eram lançados galantemente nas senhoritas, bem em cima do coração, ou em transeuntes distraídos. Surgiu então a primeira marchinha carnavalesca...
Em 1911 foi inaugurado o Cassino Politeama, logo seguido por outras casas de diversões e pelo Grande Hotel, de alto luxo para a época, os quais atraíam para Poços a elite da sociedade paulista. Começou então um carnaval digno das cidades grandes. Eram comuns fantasias de Pierrôs e Colombinas, assim como máscaras de fartos bigodes, as batalhas de serpentinas e confetes, porém o personagem constante nas ruas e salões era sem dúvida o lança-perfume, introduzido no Brasil por volta de 1906.
Enquanto os veranistas se divertiam nos bailes animados por conjuntos que tocavam vibrantes maxixes ou por orquestras de "jazz-band", o povo desfilava nas ruas formando ranchos barulhentos, inspirados em costumes e toadas folclóricas. Estes desfiles realizados na Praça Pedro Sanches, eram aplaudidos pelas famílias da sociedade local, que apreciavam o espetáculo sentadas em cadeiras colocadas nas calçadas de clubes, residências e hotéis.
Naquela ocasião apareceu umn novo ritmo de música urbana, que seria o maior sucesso desta festa popular -o samba.
Na década de 20 a classe média aderiu aos cortejos momescos, surgindo blocos estruturados, com estandartes e emblemas apropriados. Temos notícias, em Poços de Caldas, do "Grupo do Felix", organizado em 1925 por jovens hospedados no Hotel da Empresa, homenageando o endiabrado gatinho da Paramount.
O advento dos carros conversíveis trouxe ao carnaval de rua um novo elemento, o corso, onde as belas meninas, ricamente fantasiadas, manifestavam sua alegria cantando e atirando serpentinas coloridas, confetes e lança-perfume nos espectadores.
À noite todo o "soçaite" se divertia nos bailes beneficentes, em clubes fechados ou em cassinos, entre os quais merece destaque "O Ponto", em cuja orquestra era pianista o nosso grande Ary Barroso.
Foi a partir de 1933, com a fundação da Rádio Cultura, que o Carnaval de Poços teve seu maior esplendor. Devido à iniciativa do Dr. Pedro Junqueira, um dos fundadores daquela emissora, os festejos momescos locais contaram com a presença dos maiores nomes da música popular: Aurora e Carmem Miranda, Heleninha Costa, Francisco Alves, Ciro Monteiro, Carlos Galhardo, assim como do Bando da Lua e do Trio de Ouro.
Em 1938 fez sua estréia em nossa cidade o primeiro Rei Momo, personificado pelo palhaço Arrelia.
No período da guerra as famílias abstadas, impedidas de viajarem para a Europa, passavam a temporada de férias em Poços de Caldas e os cassinos, regorgitando de gente, começaram a apresentar caríssimos shows pré-carnavalescos. O racionamento de gasolina e os automóveis fechados provocaram o aparecimentos dos carros alegóricos, que se tornaram cada vez mais bonitos e criativos, pois eram aplaudidos pela nata política do país.
O fechamento do jogo em 1946 não trouxe a decadência das festas carnavalescas na maior estância hidromineral da América Latina, pois os turistas continuaram afluindo de todos os estados brasileiros. Em 1952 tivemos um espetáculo inédito, que permaneceu na memória de quantos o viram: o banho de piscina, à fantasia, apresentado pelos "Aqualoucos" vestidos de banhistas da "Belle Époque", que brindaram a população com emocionantes e ousadas acrobacias aquáticas.
Na década de 60 os salões continuaram fervilhando de foliões, mas o carnaval de rua sofreu uma queda vertical com a proibição do lança-perfume e as restrições policiais. A juventude não tinha como se divertir, pois seu acesso aos clubes era proibido. Foi quando a Associação Atlética Caldense, apoiada pelo Juiz de Menores, Dr. Milton Mendes dos Reis, iniciou os bailes familiares, permitindo a entrada de jovens de 15 anos. Incentivados com este fato, eles começaram a organizar, com grande sucesso, os seus próprios blocos.
Com a criação do Conselho Municipal de Turismo em 1971 e posteriormente a Secretaria Municipal de Turismo e Comunicações, o carnaval de rua, estimulado pelos poderes públicos, que nele descobriram um grande polo de atração turística, vem se aperfeiçoando de ano para ano. Continuaram os bailes no Palace Casino, na Caldense e em outros clubes, quando anualmente é escolhida a Rainha do Carnaval, para acompanhar o Rei Momo.
Na década de 1990, os concursos de blocos e Escolas de Samba, com seus carros alegóricos, passaram a se realizar na Avenida Francisco Salles, onde são armadas arquibancadas para a população assistir melhor acomodada aos desfiles de suas agremiações preferidas. O Carnaval de Poços de Caldas conseguiu atrair para nossa cidade as atenções, não somente das regiões circunvizinhas, como de outros estados do Brasil". Esse artigo foi publicado no livro Memórias Históricas de Poços de Caldas (2002), de D. Nilza Botelho Megale.
A foto acima, de autoria do Sr. Décio Alves de Morais, mostra um corso de carnaval da década de 1950, na Rua Junqueiras. Observe ainda, à esquerda, o prédio do antigo Casino Imperial.
Clique nas imagens do Memória de Poços de Caldas para ampliá-las.
1 comentários:
Rubens, maravilha de fotografia!
Pelo compêndio automotivo, estamos em 1952, se carnaval mesmo, comecinho do ano, pois só vejo carros até 1951.
Chevroler POwer-Guide 1951 conversível, Ford Custom 51, Studbaker Commander 51, Cadillac 51, Henry J, Ford Consul, Willys, Vw Split Window e a mais intrigante é a Kombi Samba!!
Grande abraço,
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Memória de Poços de Caldas é um trabalho cultural, sem fins lucrativos, e democrático. Aqueles que quiserem se comunicar diretamente com o autor podem fazê-lo pelo email rubens.caruso@uol.com.br .